O PAPEL É O MELHOR OUVINTE, PORQUE NÃO TE ESCUTA SÓ PRA ESPERAR A VEZ DE FALAR






domingo, 21 de fevereiro de 2010

Confusão em Palavras

“Às vezes estamos em uma rota de colisão e nós não sabemos. Seja por acidente ou intencional, não podemos fazer nada a respeito.”



O pai havia prometido para a pequena Cecília pegá-la na escola aquele dia. Ele já saíra de seu escritório, mas percebeu que esquecia o celular em cima da mesa da sala e voltou para pegá-lo. Tentou chamar o elevador, que quebrara poucos minutos antes. Então, resolveu ir de escada.



Enquanto ele subia as escadas, Cecília guardava o material dentro de sua mochilinha após o toque que avisava o final da aula. Ela terminava de guardar o material, quando seu pai já pegava o carro para seguir em direção à escola.



Um vendedor ambulante de livrinhos infantis resolveu, naquela tarde, trocar a rua na qual oferecia sua mercadoria para os motoristas parados nos faróis. Cecília se despedia de sua professora e amiguinhos.



O pai de Cecília parou no mesmo semáforo que agora o vendedor vendia os livrinhos, e encostou o carro para poder comprar alguns para sua filha. No entanto, teve que ir ao banco logo na esquina para sacar algum dinheiro já que havia, naquele momento, apenas cartões e talões de cheque em sua carteira. Ao mesmo tempo que ele pagava o ambulante, Cecília parava para amarrar seus sapatos.



Quando o pai se voltava para o carro, decidido a continuar seu caminho, encontrou na calçada um amigo de infância, que teimou em tomar seu tempo e compartilhar tudo que acontecera em sua vida enquanto estiveram separados. Ao passo que ele escutava as aventuras do amigo, Cecília caminhava até o portão da escolinha onde combinara de se encontrar com seu papai.



Terminada a conversa, atrasado pelo encontro de seu velho amigo que havia parado para comprar revistinhas para a filha, ele pegou o celular e ordenou para que começassem a ação sem ele. O pai de Cecília estava parado no trânsito agora, aguardando o semáforo antes de cinco quarteirões da escola. No portão, onde a filha esperava, cinco homens encapuzados mandavam todos entrar, fechando as entradas e saídas, querendo roubar tudo que tivesse valor. Não tinham pena, nem dó. Mas tinham ouvido, e o choro da menina que estava no portão irritou-os ao ponto de fazê-la refém.



Quando chegou à escola, a polícia já interditara o local. Muitos homens fardados, e muita confusão. Neste momento, a garotinha tinha seu celular roubado e pela agenda telefônica, o cabeça da quadrilha conseguiu falar com o assim descrito 'papai' daquela criança que, por sinal, não parava de chorar.



Assim que tocou o telefone, ele reconheceu a voz. Talvez não reconheceria um dia antes, não depois de tanto tempo afastados. Mas ele reconheceu, tinha escutado a mesma voz, na sua frente, cara a cara há poucos minutos. O telefone ficou mudo...



Dias depois, fora encontrada a alma de Cecilia sendo carregada por dois anjos, que puxavam-na pelas mãos sentido contrário da chuva que caia molhando o pequeno corpo que tinha sido a morada daquele espírito. Poucos metros depois, o corpo daquele amigo do pai dela jazia já morto, sem anjos, sem alma. Em uma de suas mãos, apenas a arma que levara à nuca.



Se o pai de Cecília não tivesse esquecido o celular, se o elevador não tivesse quebrado, se o vendedor não tivesse trocado de rua naquela tarde, se ele não tivesse ido até o banco, se não tivesse parado para conversar com seu amigo que viria a se tornar seu maior significado para odio, Cecília teria voltado para casa com toda a sua infância pela frente. Mas a vida não é assim, e Cecília estava morta.

Um comentário:

  1. PQP MEU QUE CHOCANTEEEEEE =///
    mas sabe, isso também me lembrou de Benjamin Bunton, numa cena que mostra mais ou menos isso, sobre a mulher q o personagem conhece no filme. "se nao tivesse parado pra buscar o café, se o táxi nao tivesse estacionado, se isso nao acontecesse etc etc... a fulana nao teria sido atropelada" .. algo assim.
    mto triste =/
    mas ao mesmo tempo mto bom !

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