O PAPEL É O MELHOR OUVINTE, PORQUE NÃO TE ESCUTA SÓ PRA ESPERAR A VEZ DE FALAR






quinta-feira, 31 de março de 2011

Quebrando as Paredes

-por Daniel Bagagli

Nossa cabeça funciona como as quatro paredes de uma casa, possuindo também um par de janelas, que são nossos olhos. Como toda janela de casa, nossos olhos possibilitam a visão do exterior de nossas paredes, do mundo fora delas.
E o problema mora exatamente aí: a amplitude de visão das janelas de nossas casas é finita. Conseguimos enxergar apenas uma fração do mundo visível - 180 graus e alguma distância cujos valores exatos não importam, pois são apenas frações minúsculas de um todo.
As paredes exercem dupla função para esse problema: diminuem a amplitude de visão à metade, além de não permitirem movimentação. Ou seja: das janelas de nossas casas, sempre teremos a mesma paisagem.
E desse pequeno mundo que enxergamos, absorvemos informações - adquirimos conhecimento. Passamos a entender essa paisagem, formando, assim, opiniões. Essas, por estarem trancadas, chocam-se interminavelmente contra as quatro paredes de nossas cabeças.
E apesar de termos opiniões, elas são apenas sobre aquilo que vemos: o que nos torna completamente cegos para aquilo que não CONSEGUIMOS enxergar.
Sobre aquela nossa paisagem costumeira, temos os nossos ‘certos’ e ‘errados’. Mas que SÓ podem e SÓ devem ser aplicados àquela parcela do espaço. Em nosso mundo, conhecidos como ‘certos’ e ‘errados’. Em um outro (escondido atrás de nossas paredes e que não conseguimos enxergar), conhecidos como ‘errados’ e ‘certos’.
A existência de paredes em nosso mundo nos cega. Impede-nos de, a cada dia, reavaliarmos nossas opiniões. Mantêm-nos longe de uma convivência digna entre todos. Impede-nos de perceber que não existe UMA SÓ paisagem. Nem um só mundo.
Existem vários pequenos mundos, cada um digno de sua beleza, de seus ‘certos’ e ‘errados’, que formam, em uma amplitude de 360 graus e a distâncias infinitas, o nosso Mundo.

sábado, 26 de março de 2011

Hipertrofia do Poder Executivo no regime brasileiro – Análise da teoria sobre Separação dos Poderes


(adaptação de A Liberdade Guiando o Povo, de Eugène Delacroix)
-por Otávio Silva

A ideia de dividir o poder do Estado é tão antiga quanto às reflexões de Aristóteles em seu livro A Política. Isso devido ao confronto inerente entre o poder e o Estado, cuja discussão tornou-se tema de ciência ao estabelecer formas, sistemas, regimes, tipos de governo, tudo a fim de definir as diferentes formas de aquisição, distribuição e exercício do poder.
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A teoria atual de divisão das funções e tarefas do Estado, afinal de contas o poder dele é indivisível, apoiada na Revolução Francesa ao contemplar principalmente a liberdade individual contra o Estado, vem da obra O Espírito das Leis de Montesquieu. Inspirado em John Locke e no Bill of Rights, o filósofo francês consagrou um dos princípios constitucionais mais importantes da democracia, e com isso, criou institutos e órgãos responsáveis pela administração, legislação e jurisdição. Tudo isso a fim de limitar a possibilidade do arbítrio e do abuso na condução do poder estatal, uma vez que, como prevê nossa querida Constituição Federal em parágrafo único de seu primeiro dispositivo: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos, ou diretamente”.
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Não obstante, vale lembrar que os órgãos criados a partir da teoria em questão devem ser autônomos, de maneira que atuem, sobretudo, com independência e harmonia. Via de regra, esses órgãos executam funções distintas e indelegáveis. Entretanto, é comum e perfeitamente saudável para a maior liberdade entre eles, que cada um exerça, além de seu próprio papel, um pouco do papel dos outros.
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Tomando, então, como base o texto constitucional, podemos exemplificar uma função atípica de cada um dos poderes do Estado brasileiro. O artigo 52, inciso I dispõe sobre o desempenho de uma atividade de caráter jurídica de um órgão tipicamente legislador: “Compete privativamente ao Senado Federal processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles.”; da mesma maneira que a alínea b do segundo inciso do artigo 96 antecipa uma característica administrativa a órgãos do Poder Judiciário: “Compete privativamente ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores e aos Tribunais de Justiça propor ao Poder Legislativo respectivo [...]a criação e a extinção de cargos e a remuneração dos seus serviços auxiliares e dos juízos que lhes forem vinculados, bem como a fixação do subsídio de seus membros e dos juízes, inclusive dos tribunais inferiores”; analogamente, o artigo 62 indica: “Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.”
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Nesse último exemplo, temos a evidente intromissão do Poder Executivo em uma tarefa de caráter legislativo. Normal, se fosse utilizado de maneira razoável. No entanto, sabendo que somente no dia 31 de dezembro do último ano foram publicadas nada menos que seis medidas provisórias. Desde a promulgação da Constituição Federal, foram mais de quinhentas! Será que o dispositivo, que deveria ser exceção, não está sendo utilizado em demasia?
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Além disso, é importante ressaltar a ligação dos membros do Supremo Tribunal Federal, órgão máximo do Poder Judiciário, guardião dos princípios e artigos da Constituição, à figura pessoal do Presidente, como ressalva o parágrafo único do artigo 101 da CF/88: “Os Ministros do Supremo Tribunal Federal serão nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal.”; tendo em vista o fato de nenhuma indicação ter sido reprovada pelo Senado até hoje, tal “sabatina” é apenas mais uma confirmação de posse. Exatamente ao contrário do que se tem no modelo estadunidense, em que muitos indicados renunciam à possibilidade de assumir o cargo antes mesmo da apreciação da câmara legislativa, temendo a posterior rejeição de seu nome.
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É válido para reflexão, já que a extrapolação dos limites do poder por uma das partes do Estado seria de total prejuízo à eficácia e manutenção da democracia. Isto posto, cabe também uma rápida análise política da História mais recente do Brasil.
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Após deixarmos de sermos colônia de exploração dos portugueses, logo seguimos o modelo de Império da metrópole lusitana. Acostumamo-nos à figura de um líder que concentrava as figuras de chefe de Estado e chefe de governo, suportando, inclusive, a existência de um inédito e irônico “parlamentarismo às avessas”, controlado por um “Poder Moderador”.
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Passada, pois, a República Velha, o “pai dos pobres”, Getúlio Vargas conseguiu, tanto sob a égide da democracia, quanto com uso da força ditatorial do Estado Novo, reunir, em sua imagem e carisma, a responsabilidade por todos os tópicos do país: a situação econômica, a segurança jurídica e política, o desenvolvimento da indústria, da agricultura, a organização da cultura etc. De maneira igual ao Estado Novo, estabeleceu-se também um regime concentrado na autoridade de líderes, dessa vez, militares, durante a segunda metade do último século.
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Temos, portanto, pouco tempo de maturidade e desenvolvimento da democracia. Tempo este, insuficiente para que mudemos não só figurinhas carimbadas da política brasileira, advindas de épocas menos republicanas, mas insuficiente também para mudarmos a cultura da geração que cresceu com essa centralização das tarefas do Estado e também aprendeu de seus ascendentes sobre esse modo de exercício do poder. É tão evidente esse pensamento do brasileiro que costumeiramente, prefere-se discutir a escolha de membros dos executivos, seja qual for a esfera de atuação, a dos membros das respectivas câmaras legislativas. Nessa mesma linha, é mais fácil alguém lembrar-se de para quem votou no Executivo em todas as eleições que participou, do que em quem depositou seu sufrágio nas últimas para o Legislativo.
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E, por fim, frente ao nosso passado de claras manifestações abusivas e altamente concentradas do poder, a presente hipertrofia dos órgãos de caráter administrativos com relação aos outros, permite, gradual ou mascaradamente, a adoção de regimes menos democráticos no exercício do governo. Cabe, portanto, à atual e às próximas gerações, respeitar cada vez mais a distribuição das funções estatais e fortalecer os institutos criados para proteger essa divisão, a fim de que não deixemos o Brasil passar pelos males já enfrentados e para que aperfeiçoemos cada vez mais a prática democrática.

Wikipedia - Teoria da Separação dos Poderes
Planalto - Medidas Provisórias
Wikipedia - História Política do Brasil

domingo, 13 de março de 2011

O que é, o que é?

-por Otávio Silva

Um trio elétrico inteiro
Caixas de som
A veia pulsa nas têmporas
A batida forte
O cheiro de vida
O coração sobe à mente
Confetes e serpentina, espuma e purpurina
O gosto de boca na sua
O sono tarda a vir

Uma escola de samba inteira
Pandeiro, cuíca, o surdo, o mudo, a festa
A fome longe de sua barriga
A bateria forte
Paradinhas, marchinhas, ritmos e enredos
As pernas soltaram-se dos pés
Fantasias, homenagens, sonhos e devaneios
O calor é intenso

Tudo isso, dentro da sua cabeça, tem outro nome:
Enxaqueca.