O PAPEL É O MELHOR OUVINTE, PORQUE NÃO TE ESCUTA SÓ PRA ESPERAR A VEZ DE FALAR






segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Nostalgie


- por Camilla Lopes

No fundo da sua alma, esperava um acontecimento. Como marujos em perigo, seus olhos desesperados sondavam as solidões da vida a que fora destinada, procurando na distância alguma vela branca, nas brumas do horizonte. Esse acontecimento era uma incógnita. Todas as manhãs, ao despertar, tinha a impressão de que ele ocorreria no transcorrer daquele dia. Ouvia todos os ruídos, erguia-se em sobressalto, espantada de que o acontecimento não chegasse. Ao pôr do sol, sempre mais triste, desejava que o dia seguinte não tardasse. – Madame Bovary

O próprio Gustave Flaubert, autor do livro, certa vez confessou: “Emma Bovary c’est moi”. Eu ousaria ir mais fundo: todos somos. Quem nunca ficou aflito de ansiedade para algo acontecer em sua vida mesmo quando tudo estava em seu devido lugar que atire a primeira pedra. Talvez o problema seja exatamente tudo estar em seu lugar. Ok, eu devo estar falando o óbvio. A felicidade não está no objetivo alcançado, mas no caminho percorrido, certo? Certo. O real problema, acho, é quando começamos a pensar em coisas que aconteceram e que gostaríamos que acontecessem de novo, ou então que idealizamos e não se concretizaram do jeito esperado. Às vezes até mesmo o que queremos dizer acaba perdendo o contexto e ficando para trás. Pela atual estabilidade, acabamos perdidos nas lembranças - tanto do que foi, quanto do que teria sido -, as quais pouco a pouco se apagam. “Os detalhes se enevoaram, mas a saudade ficou”. É, queridos. Ninguém vive cada dia como se fosse o último.

Um comentário:

  1. Sinto que precisava ler isso. É como me sinto, esperando sempre...

    Disse tudo (:

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